Estou com vagalumes no olhar. Passo o dia a contar cada luzinha que pisca, acordada. Ninguém os vê, apenas eu. De dia ou de noite. O olhar vem de dentro, de um cantinho do fundo de mim, e vai para o fim do longe, vagalúmico.
... até que falou prá mim no feriadão, no Museu da Língua Portuguesa:
"A vida, Senhor Visconde, é um pisca-pisca. A gente nasce, isto é, começa a piscar. Quem pára de piscar, chegou ao fim, morreu. Piscar é abrir e fechar os olhos – viver é isso. É um dorme-e-acorda, dorme-e-acorda, até que dorme e não acorda mais. A vida das gentes neste mundo, senhor sabugo, é isso. Um rosário de piscadas. Cada pisco é um dia. Pisca e mama. Pisca e anda. Pisca e brinca. Pisca e estuda. Pisca e ama. Pisca e cria filhos. Pisca e geme os reumatismos. Por fim, pisca pela última vez e morre. – E depois que morre – perguntou o Visconde. – Depois que morre, vira hipótese. É ou não é?"