sexta-feira, 30 de novembro de 2007

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Horizonte Invisível












“Cada cidade recebe a forma do deserto a que se opõe”
(Ítalo Calvino, Cidades Invisíveis)

Há apenas duas maneiras de se chegar a São Paulo: por terra ou pelo ar. Não importa qual delas o viajante escolha, a primeira e a última impressão que terá da cidade serão as mesmas.

Quem chega por terra, por uma das estradas vindas do interior, depois de cruzar inúmeras paisagens verdejantes, vê despontar no horizonte, logo depois de uma curva, e por detrás de um monte, uma massa descolorida e disforme, fluida como um grande lago, que aos poucos se vai transmutando em formas verticais e retangulares. Avista-se na proximidade cidade de linhas retas, em que o curvilíneo não aparece, e o verticalismo suplanta a forma do horizonte, até eliminá-lo por completo.

Já o viajante que vem por cima, surpreende-se logo de início com a deformidade das formas. A geografia de São Paulo que se distingue do céu é como uma enorme represa que vai inundando desordenadamente os limites do visível. Por entre morros, veias e estradas, espalha-se o lago cinzento que se perde de vista até se fundir com o horizonte. Percebe-se a desordem e a desorganização em figuras a princípio irreconhecíveis. Tudo é cinza, escuro, incolor. Até que se vai descendo lentamente, e logo o horizonte se esconde por detrás da imobilidade das construções verticais que parecem brotar do chão.

Por cima ou por baixo, chega-se à cidade sólida que se avista de longe como um imenso mar. De perto, o espaço inalcançável de seu horizonte vertical, no qual a vista se perde, sem poder se fixar a um ponto particular.

Cidade que se suspende e se alonga em vértice, onde sonhos, desejos e medos se fundem em um emaranhado de formas e cores desconexas.

“As cidades, como os sonhos, são construídas por desejos e medos, ainda que o fio condutor de seu discurso seja secreto, que as suas regras sejam absurdas, as suas perspectivas enganosas, e que todas as coisas escondam uma outra coisa”
(Ítalo Calvino.
Cidades Invisíveis)


quinta-feira, 22 de novembro de 2007

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

O FERIADÃO






























Foi numa cidade invisível,
com nome masculino,
mas de alma feminina.

Tinha uma casa no alto da montanha.
Bem lá no alto.
E uma rede em parede de vidro,
com o vale todo se estendendo lá embaixo.

Chovia fininho lá fora.

Mas não faltou comilança.
Nem inúmeros cochilos, de manhã, de tarde e de noite.

Teve pneu em estrada de terra,
caminhos com cheiro de mato,
e queijo branco da fazenda com goiabada do interior.
Teve massagem em cabana no mato,
e cheiro de pão no forno à lenha.


Teve cachoeiras e rios,
meditação e dormidinha com barulhinho de água.
Teve muita leitura: na rede, na grama, no sofá, na cachoeira, no tapete da sala...
E também cantoria e histórias ao som do violão.
Falou-se de comida, família, literatura, homens e astrologia.

Teve jantar à luz de velas
e velas e vinho aquecendo a conversa,
ora iluminando, ora escondendo
o olhar, a expressão, o pensamento.

Lá longe, no fim do vale, o horizonte.
E aqui, bem pertinho, bem juntinho,
cinco amigas em perfeita harmonia.
Vozes e almas que conversam e atravessam o tempo,
boundlessly.

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Perdi a chave...


da casa aqui de dentro. Já faz algum tempo! Agora basta saber como entrar, sem arrombar a porta!

A MULHER E A CASA

Tua sedução é menos
de mulher do que de casa:
pois vem de como é por dentro
ou por detrás da fachada.

Mesmo quando ela possui
tua plácida elegância,
esse teu reboco claro,
riso franco de varandas,

uma casa não é nunca
só para ser contemplada;
melhor: somente por dentro
é possível contemplá-la.

Seduz pelo que é dentro,
ou será, quando se abra;
pelo que pode ser dentro
de suas paredes fechadas;

pelo que dentro fizeram
com seus vazios, com o nada;
pelos espaços de dentro,
não pelo que dentro guarda;

pelos espaços de dentro:
seus recintos, suas áreas,
organizando-se dentro
em corredores e salas,

os quais sugerindo ao homem
estâncias aconchegadas,
paredes bem revestidas
ou recessos bons de cavas,

exercem sobre esse homem
efeito igual ao que causas:
a vontade de corrê-la
por dentro, de visitá-la.

(João Cabral de Melo Neto)

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Visita inesperada


Foto by
Mário Pedroni






Até ontem não sabia o que fazer com o meu feriadão de 6 dias.

E eis que hoje acordo com o Ítalo Calvino batendo à minha porta.
Não fez gesto algum, apenas disse:
"Se meus desejos vão a ti em caravana, é do frescor dos olhos teus que ando à procura."

E meu sorriso já não cabia mais no rosto.
Parei tudo o que estava fazendo e agora arrumo minhas malas.

Hoje à noite partiremos para as cidades invisíveis, em busca de algo que temos em comum. Não das paisagens que se vão apresentando à nossa frente, mas das respostas que elas dão às nossas perguntas.

É impressionante como algumas pessoas aparecem em nossa vida assim, de repente. Pessoas que nos são familiares, mas as quais nunca vimos tão de perto.

E surgem como uma caixinha de surpresas, quando menos esperamos.
Mas exatamente no momento certo!

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Qual é a sua combinação?











Panetone com requeijão

Panetone com manteiga
Panetone com geléia
Panetone com mel
Panetone com chocolate
Panetone com sorvete
Panetone com calda de chocolate

Gosto que a gente guarda no pensamento
E só visita uma vez por ano

Outro cheiro-memória
que me lembra os natais na casa da minha vó
e os embrulhos que minha mãe mandava para mim no Canadá perto no fim do ano
e meu irmão pedindo panetone depois do almoço, da janta e do café da manhã

Hoje comi meu primeiro pedaço do ano
Ou melhor, do quase-não-mais-ano
E naveguei pelas lembranças
até que elas apagassem
o fim, o sem-fim
Travessia

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

LA RECHERCHE


Foto by
Mário Pedroni






"Tu cherches quoi?"
"Je cherche un régard dans la foule."
"Et c'est quoi, ce régard?"
"C'est la poesie d'un instant magique."
"Mais l'instant est ephémère, il se perd, il se va. Jamais on ne peut le garder. Et la poésie, on la garde, on la régistre."
"Alors, il ne s'agit seulement des mots sur la feuille blanche. L'image, la photographie, a aussi une poésie qu'on n'écoute pas, mais qu'on la sent. Et je vois, dans l'imprisionement de ce régard sur le papier photographique, la plus intense création poétique."

terça-feira, 6 de novembro de 2007

BOUNDLESSLY WORDLESS










Às vezes, as sensações experimentadas pelos sentidos, pela mente, pelo corpo ou pelo coração não precisam de palavras.

Precisam apenas serem sentidas e vividas intensamente.

Para quê definições?
Fecho os olhos simplesmente.
E o silêncio do sentir já me diz tudo o que quero ouvir naquele momento.

domingo, 4 de novembro de 2007

Minhas sextas, sábados e domingos










Rápido e Rasteiro


Vai ter uma festa

que eu vou dançar

até o sapato pedir pra parar.

aí eu paro

tiro o sapato

e danço o resto da vida.


Chacal

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Que calor, meu Deus!











Hoje percebi que o céu de São Paulo não consegue chover direito.

Ensaia algumas modestas gotas pela noite, porém engole a real tristeza e derrama apenas despretensioso suor. Não há o pranto forte, verdadeiro e necessário, capaz de esfriar o concreto urbano, quase em chamas.

Hoje achei que ia derreter.
E agora chove uma chuvinha miúda, tímida, vagarosa.
De que é que o céu precisa para chorar com mais intensidade?

Através


Foto by
Mário Pedroni











Através

Parte uma fagulha
manchada,
perde-se, segue o
corte.
Risca a tez da noite,
pontua
a pele vazada.
Retoca o passo,
repele,
marca o ritmo de asa.
O tornado imóvel,
volve-
se,
relâmpago que assalta
e fecunda.

(Sérgio Bacchi Machado)